terça-feira, 26 de maio de 2009
DEFICIÊNCIA VISUAL - Artigo da LER PRA VER - CEGO PRECISA SEMPRE DE AJUDA ?
VEJAM MAIS SOBRE O ARTIGO DA LERPRAVER: CEGO NECESSITA SEMPRE DE AJUDA, EM :
http://www.lerparaver.com/node/7677
Entrevista a Filipe Azevedo, deficiente visual
Submetido em Domingo, 24/02/2008 - 23:24 por Lerparaver
Com o tema: Deficiência visual
"Se puderes olhar, vê. Se podes ver, repara.", in Ensaio sobre a cegueira de José Saramago
Feche os olhos e tente permanecer assim o máximo de tempo que conseguir.
Levante-se e caminhe, circule entre a escuridão. O objectivo deste exercício poderia servir para tentar imaginar o que poderá significar ser cego. Mas não serve. Porque se ficar desorientado, ou assustado ou tropeçar sobre um qualquer obstáculo pode sempre abrir os olhos e respirar fundo. Pode eventualmente servir para imaginar que se não pudesse voltar a olhar o mundo, a sensação de medo que sentiria. A escuridão para quem vê é algo muitas vezes aterrador, encolhemos perante o gigante, tudo parece ecoar no vazio e os sons ampliam no espaço. Tomamos os sentidos como dados adquiridos e falta a sensibilidade para construir um mundo mais acessível, mais justo para todos, onde nos possamos movimentar e aceder à informação com liberdade.
Em Portugal existem cerca de 163 mil cegos, e em todo o mundo 45 milhões e 180 milhões de amblíopes.
Uma pessoa cega é aquela que não possui potencial visual mas que pode, por vezes, ter uma percepção da luminosidade.
Segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), a deficiência visual engloba duas grandes categorias: a cegueira e a amblíopia (reduzida capacidade visual - qualquer que seja a origem - e que não melhora através de correcção óptica), diferenciadas em função dos critérios de "acuidade visual" (do melhor olho após correcção) e "campo visual".
De um ponto de vista do desenvolvimento da pessoa com deficiência visual, a Cegueira pode ser de três tipos: congénita (se surge dos 0 ao 1 ano de idade), precoce (se surge entre o 1º e o 3º ano de idade) ou adquirida (se surge após os 3 anos de idade). Uma pessoa com cegueira congénita, dada a ausência ou pouco referencial visual (imagem mental), possui uma representação intelectualizada do ambiente (cores, perspectivas, volumes, relevos) tem total ausência do conceito visual.
O Filipe Azevedo que nos guiou pelo seu mundo sofre de cegueira congénita. Tem 26 anos e não tem medo da escuridão porque não tem noção da escuridão. È telefonista na TUB (Transportes Urbanos de Braga) e mora com a sua cara-metade que também é cega.
No dia-a-dia fazem tudo sozinhos. "Às 7h30 levanto-me, depois apanho um autocarro para ir trabalhar e à noite volto. Nos tempos de lazer, gosto muito de informática e de música, durante muitos anos trabalhei na música, toco piano e órgão, já toquei em casamentos e bailes. Aqui na ACAPO (Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal) temos um grupo de teatro e música. No computador tenho total autonomia, há softwares de leitura de voz, depois podemos acupular uma linha Braille, há impressoras Braille, leitores ópticos de caracteres. Também sou formador de informática para pessoas cegas, trabalho com computadores há 14 anos".
Na circulação pela cidade, para fazer o reconhecimento dos caminhos, "primeiro vou com alguém e faço uma ou duas vezes e decoro através de pontos de referência. Um cego não consegue circular sem pontos de referência. Aponto esses pontos ou não tenho problemas em perguntar a alguém. Prefiro perguntar três vezes do que ficar em casa".
Mas nas questões que envolvem a mobilidade, são muitos os obstáculos que limitam ou dificultam a circulação na cidade. Uma das carências que o Filipe sente em termos de mobilidade é a falta de passadeiras tácteis, "são este tipo de situações que o poder politico nem sabe que existem e são coisas muito simples que fazem a diferença.
Podia investir-se mais, aquando do Euro 2004 foram construídas passadeiras com rampas mas às não dá para detectar as rampas porque há uma série de obstáculos". Relativamente a acidentes, já teve vários: "já caí à linha de comboio, faltou o piso táctil. Na altura a CP prometeu que punha o piso, e é uma coisa muito simples de fazer, mesmo em termos económicos. Aqui na estação em Braga aquilo está muito mal feito. Às vezes detecto a beira do fosso da linha com a bengala.
Quando caí tinha uma mochila que amparou a queda e não me magoei muito mas fiquei traumatizado.
Os cegos andam muito de comboio, o que lhes permite ter muita autonomia.
As estações têm a linha amarela a sinalizar, mas se tivesse um piso de borracha, ia pela gare e dava para sentir a textura".
Mas nas questões da mobilidade Filipe aponta as obras como o maior problema, "as obras são um problema gravíssimo, é o principal problema. Há uma falta de sensibilidade de quem faz as leis. E ainda por cima, há pessoas que não têm sensibilidade nenhuma, deixam as caixas das carrinhas abertas, por exemplo. Depois de eu bater lá com a cabeça passam a ter mais cuidado, mas tenho que bater primeiro. E não percebo porque é que as obras demoram tanto tempo, anos até, as ruas às vezes ficam sem os passeios, o que me obriga a ir pela estrada. Depois temos os obstáculos, as caixas de electricidade que deviam ir até ao chão (para poderem ser detectadas com a bengala) e a sinalética inapropriada". Relativamente ao mau estacionamento de veículos, "acho o cúmulo estacionarem em cima da passadeira, não consigo conceber e o estacionamento em cima do passeio é uma questão de bom senso. Com a técnica correcta é fácil de detectar um automóvel".
Ao ver uma pessoa cega ou com outro tipo de deficiência a atravessar a estrada, por exemplo, o primeiro impulso é ajudar. Mas às vezes as coisas não são como parecem. "As pessoas ao verem um cego a procurar a passadeira tentam ajudar porque pensam que ele está perdido. São já muitos anos a conviver com isto, divertimo-nos e convivemos perfeitamente com isso. Ainda há cerca de três meses, ali no Arco da Porta Nova, eu costumo subir a rua das Carvalheiras para ir para a ACAPO e nesse dia ia para a Estação e comecei a descer a rua e uma senhora começou aos gritos a tentar-me indicar o caminho porque pensou que me tinha enganado. O problema às vezes são os comportamentos pouco discretos, as pessoas são capazes de falar a altos berros quando bastava falar ao tocar no braço. Quando isso acontece, fico envergonhado, como qualquer cidadão que quando é o centro das atenções na via pública se sente mal. As pessoas devem ser mais discretas, à partida, a cegueira não acarreta outras deficiências". Apesar destas falhas Filipe classifica Braga como uma boa cidade em termos de mobilidade "acho que tem sido feito um esforço.
O centro da cidade é pedonal, não temos passeios muito estreitos como no Porto. Mas os problemas de mobilidades não afectam só as pessoas cegas.
A cidade deve ser acessível a cegos, a carrinhos de bebés, cadeiras de rodas. A camada populacional a quem dizem respeito estas questões de mobilidade é muito abrangente".
Como bom exemplo aponta o protocolo que a ACAPO celebrou com os STCP (Sociedade de Transportes Colectivos do Porto) no dia 18 de Setembro de 2007 que visa promover a mobilidade dos cidadãos com deficiência visual, em especial no que concerne ao acesso aos transportes públicos de passageiros em modo de autocarro, que têm um sistema audível das paragens.
Outra questão que aponta concerne à televisão, "devia fazer-se a legendagem de idiomas na televisão, no caso do telejornal, a legendagem em voz off deveria sobrepor-se ao original noutro idioma. Há que democratizar o acesso à informação".
Mas as falhas também existem nas associações que debatem e sensibilizam para estas questões, "o associativismo das pessoas cegas já viveu melhores dias, não existe uma concertação estratégica para sugerir, pressionar, explicar estas questões, a sua importância, aí a culpa também é um bocado nossa. E há muitas pessoas que iriam ser potenciais beneficiadas mas não fazem pressão porque não querem admitir nada, porque se calhar têm algum complexo de inferioridade".
Mas há coisas que vão mudando em termos de mentalidade, ainda que muito lentamente, "as coisas não mudam de um dia para o outro. As pessoas cegas eram vistas de um modo muito condescendente, há uns anos eram pessoas que não estavam muito integradas. As pessoas habituaram-se a ver os cegos como pessoas um bocado sem vida própria. Conheço casos de pessoas com graves problemas de socialização e o grande entrave é a família. Há casos de famílias que não deixam o filho que é cego sair, às vezes os vizinhos pressionam ´o seu filho ainda é atropelado´. Às vezes até se reabilitar passa-se muitos anos, as famílias acham que não podem fazer mais nada".
Uma pessoa cega pode estar completamente inserida numa sociedade, em termos de emprego, "antes havia a ideia que um cego só podia ser telefonista ou massagista. É um bom emprego porque não implica grandes reajustamentos ou investimentos da parte da entidade empregadora. Mas podem ser psicólogos, advogados, professores, programadores, administrativos".
Filipe desconstrói aquela ideia muito presente no senso comum de que uma pessoa cega tem os outros sentidos sobredotados, "uma pessoa cega desenvolve maior capacidade de concentração e tendência par desenvolver mais o seu tacto. Leio Braille frequentemente porque estimulei os sentidos.
Em casa tenho só um detector de luz, uma balança falante, é preciso é fazer tudo com mais concentração, mais cuidado".
Quando lhe peço para classificar em termos hierárquicos os sentidos em termos de dificuldade na ausência a resposta foi surpreendentemente: "as dificuldades que um cego atravessa são um mimo comparadas com outras deficiências, como um tetraplégico ou uma pessoa surda. O sentido mais castrador quando em falta é a audição, a seguir a falta de mobilidade dos membros, depois a cegueira. Um surdo ou um paraplégico têm que ultrapassar mais obstáculos, lutar mais. Se tudo estivesse mais preparado, teriam menos dificuldades. Há rampas, por exemplo, que parecem o Monte Everest".
Relativamente aos cães guia, que acabam por ser uma das imagens "de marca" Filipe afirma que "cão guia não vai dar às pessoas mais mobilidade, os técnicos da escola só dão os cães a quem domina as técnicas de mobilidade, as vantagens são que eles detectam passadeiras, afastam dos obstáculos, decoram os caminhos, mas nós também. Um cão precisa de muitos cuidados, admito que é útil, mas a lista de espera para ter um é muito grande e acho que muitas vezes avaliam mal os casos, dão os cães a pessoas que não têm perfil".
Esta é uma pequena parte do mundo do Filipe. "A forma como criamos o mundo não é real. Eu sempre gostei muito de futebol e durante muitos anos nunca soube como era um campo de futebol, e quando fui a um campo soube que imaginei de maneira completamente diferente. Na altura em que comecei a andar de bengala o meu professor disse- me ´vais dar muitas cabeçadas por aí, mas o que importa é chegares onde tu queres.´"
Laura Machado
Nuno F. Veiga
Fonte: Semário "O Balcão"
Um estudante de design da Muthesius Academy of Art and Design na Alemanha, Sebastian Ritzler, criou uma bengala inteligente para deficientes visuais. A Mygo usa uma câmera-sensora para medir e analisar o chão e mandar as informações coletadas para o fone de ouvido sem fio do usuário.
A bengala tem uma pequena roda na ponta que ajuda na direção indicando o caminho. A Mygo tem altura ajustável, é resistente a impactos e à prova d’água. A bengala funciona durante 6 horas usando uma bateria de lithium-ion.
A Mygo, por enquanto, é um conceito e ainda não está sendo produzida. O criador quer produzir ela por volta de U$200 para que esteja ao alcance de todos.
Veja a reportagem na BusinessWeek
Via Gizmodo e Gadget Lab.
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